sábado, 3 de dezembro de 2011

Se eu fosse fundar uma igreja

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Um e-mail que circula pela rede, mostra uma reportagem da Folha de São Paulo, onde a facilidade em se 'criar uma religião' sem qualquer critério sério é escancarada, inclusive pelo baixo custo e alta rentabilidade da isenção de impostos. Não se funda uma religião, é mais pessoal e intransferível do que o dna.

Meu alfaiate, presidente de um centro espírita, já recebeu propostas para usar de sua cultura e carisma para enriquecer, abrindo uma igreja. Ele recusou, claro, ou já não seria meu alfaiate.

Às perguntas sobre como seria uma igreja minha, estejam certos de que atrairia bem poucos seguidores. Por que? Vejam a seguir;

Seria completamente diferente desses caça-níqueis que proliferam e ganham simpatia política, pelo país. Ela não começaria com a abertura de um templo, começaria como se deve, em gestação lenta e cuidadosa. Eu me enfiaria em estudos e meditações, ampliaria minhas práticas de caridade e me exporia mais na internet, divulgando com mais amplitude minhas ideias. Levaria no mínimo cinco anos, provavelmente sete ou oito, para eu me sentir pronto para a empreitada. O motivo é que eu, fundando essa igreja, seria o sumo sacerdote, não dá para ser sequer pastor de ninguém apenas memorizando um texto sacro, seja ele qual for. Se conhecimento fosse sabedoria ou santidade, o messias seria um computador. Não é na memória que se deve guardar com mais carinho um conhecimento, é no coração. A memória falha.

Eu não sairia caçando seguidores, muito menos oferecendo três milagres pelo preço de dois para tirar fiéis de igreja alheia. Eu estaria em busca de gente que pudesse me ajudar a fundar a igreja, sem colocar anúncios em jornais para isso. Os que eu conseguisse seriam treinados nos mesmos moldes em que eu tiver sido, até estarem em condições de me ajudar. No decorrer dos treinamentos, que não durariam menos de um ano, cada um demonstraria seus talentos e sua competência, o que diria então qual seria seu grau na hierarquia da igreja, e também os ônus correspondentes. A função deles seria de sacerdócio, não existe bonificação nenhuma em ser (um legítimo) sacerdote na Terra. Os estudos não acabariam com os treinamentos para o início dos trabalhos, estariam apenas começando, inclusive para mim. Disto vocês podem imaginar que eu não conseguiria nem doze sacerdotes, principalmente porque NINGUÉM poderia viver do sacerdócio, ninguém poderia receber presentes caros dos fiéis, dispor à vontade dos recursos da igreja, enfim, precisariam ter vocação para a cousa. O dinheiro sairia de nossos bolsos, no começo. A contribuição dos fiéis seria livre. Então não haveria templos suntuosos, grandes espetáculos, canais de televisão concedidos ou comprados, enfim, seria tudo muito modesto e honesto.

A quantidade de graduações eu veria durante minha própria preparação, mas a estrutura católica me parece bastante coerente. Só não haveria discriminação às mulheres, como não houve no cristianismo original. Gingles e propagandas, como se fosse uma loja, estariam previametne banidos.

Nossos seguidores seriam co-responsáveis pela igreja. Pode-se dizer que eles fariam parte de sua hierarquia, pelo que também seriam cobrados em sua conduta, decerto que com possibilidades de ascensão. Eles teriam participação activa nos ritos e seriam encorajados a estudar e meditar, trazer novidades e divulgar nossos calendários. Aos sacerdotes caberia prestar atenção aos presentes, para detectarem qualquer sinal negativo; teriam sido preparados para isso. O amparo espiritual e psicológico ao seguidor faria parte da rotina.

As crianças seriam tratadas como tesouros. Seriam estimuladas desde cedo, desde a mais tenra idade, encorajadas a aprender sempre, raciocinar sempre. Mas principalmente a interagir e perceber que dependem umas das outras. Brincadeiras e jogos seriam elaborados para tanto, o contacto com o livro viria bem antes de colocarem suas mãos no plástico do computador, por meio de leitura de contos e fábulas. Dentro da comunidade, os petizes seriam estimulados a extravasar sua energia e aproveitar sua infância ao máximo, para evitar que se tornassem adolescentes insuportáveis, porque os suportáveis já enlouquecem seus pais o suficiente. Tão logo pudessem, passariam a ajudar em tarefas mais simples e seguras.

A juventude, essa incomrpreendida... por si mesma. Um ritual de passagem, por volta dos dez anos, marcaria o fim da infância e o início da vida de responsabilidades. Já acostumada a ajudar, a criança entraria na puberdade consciente de que a vida não é feita de brincadeiras. A preparação para o rito envolveria a família inteira, não duraria menos de uma semana. Ao fim da passagem, o jovem receberia uma vassoura e limparia o que sobrou da celebração. Seria o início da preparação para a vida adulta.

A passagem da adolescência para a vida adulta seria um pouco mais dramática, por volta dos dezesseis anos. Já acostumado a dormir na casa de colegas de igreja, ele moraria por uma semana em um apartamento, ou um quartinho, onde teria que fazer todas as tarefas domésticas e ainda se mostrar apresentável, como é com qualquer adulto.

A vida social seria intensa, mas sem futilidades. Bailes, festivais, apresentações, enfim, tudo o que pudesse ser oferecido para estreitar laços, seria providenciado. Apesar da sobriedade das celebrações, que se prestaria apenas para facilitar a conecção do seguidor, as artes seriam uma constante na comunidade. Talentos seriam estimulados e aprimorados.

Ninguém passaria por privações, todo o básico seria fornecido ao fiel em dificuldades, enquanto a comunidade o ajudaria a sair da situação. Caridade externa também faria parte da rotina, e envolveria ostensivamente os jovens, para que aprendessem a se condoer do sofrimento alheio.

Os empresários, adulados em igrejas de fachada, seriam cobrados pelo seu comportamento e pelos salários que pagassem. Não seria tolerada sonegação de espécie alguma, todas as actividades deveriam estar dentro da lei e da boa conduta. Aliás, o tratamento dado às domésticas seria especialmente observado. De que adianta repetir "Meu Deus! Meu Deus!" e sussurrar "Meu dólar! Meu Dólar"? A quem o sujeito quer enganar? Mais uma vez, teríamos poucos fiéis... Provavelmente nenhum político.

Casamentos, sim, celebraríamos, na presença de um juiz de paz. A decoração do templo não seria meramente estética, como é em quase todos os casos, ela seria elaborada para que os noivos, da porta até o altar, tivessem a gradual consciência de que estão mudando de vida, que nada será como antes e que a solteirice ficou definitivamente para trás. Sim, também haveria uma preparação prévia para os noivos, que não poderiam se casar sem conhecer bem os principais defeitos do outro, mas conhecer no dia a dia. Amar um prato com um grande pedaço de torta é fácil, amar um prato cheio de gordura para se lavar é que são elas, todo prato precisa ser lavado de vez em quando. Aos dois ficaria o aviso de que sob hipótese alguma deveria haver hierarquia dentro de casa, a não ser que um dos dois fosse claramente mais preparado para a vida do que o outro, mesmo assim uma queixa sempre poderia e deveria ser feita a um sacerdote.

A hora inevitável da morte separaria o ente querido de seu corpo, que não seria mais seu, e conseqüentemente de sua comunidade. A vontade do desencarnado seria respeitada, mas seria encorajada a doação de órgãos. O funeral seria rápido, dando tempo apenas para as despedidas. O luto seria assistido por gente capacitada e toda a comunidade ajudaria a família a retomar sua vida, que de quem foi o Meste cuida.

Gente de fora poderia aprticipar, por que não? Mas do grosso ficaria de fora, já que a maioria das actividades demandaria uma iniciação que só os fiéis teriam, necessária ao funcionamento da igreja. Convidados poderiam assistir à maioria das peças, filmes e festivais, bem como de alguns passeios e excursões. Mas não se pode dar certas regalias a quem não se comprometer à continuidade, o que só poderia ser cobrado dos seguidores. A aceitação na comunidade dependeria de uma investigação, entrevistas e análise do clero. Seria aceito o casamento com gente de fora, mas não poderíamos nos responsabilizar por ele, embora não fossemos abandonar nosso seguidor.

Em linha gerais, seria isto. Quanto à doutrina, os sacramentos, et cétera, eles apareceriam na medida da necessidade, durante a minha preparação. O importante é manter o homem ciente de que é um deus, não um mendigo, para se conformar com as misérias terrenas. Feito isso, todo o resto é supérfulo. É por isso que teríamos bem poucos seguidores... Isso se eu fosse me meter a abrir uma igreja. Deus me livre!

2 comentários:

allef souza disse...

Nanael onde fica esse tal centro do seu alfaiate? beijos!

Nanael Soubaim disse...

Allef, manquei contigo, mas também tenho mancado com todo mundo... O centro dele é em Goiânia, em um bairro pobre. Se quiser saber mais, igue (62) 3233-9426, em horário comercial, falar com o José Antônio.